Adaptação de uma anedota
Conta-se que um grande professor, dedicado, intransigente, cheio de entusiasmo pela profissão, morreu e foi diretamente para o céu. Lá chegando, pegou uma fila enorme, atrás de muitos outros que aguardavam ser atendidos.
Antes de chegar a sua vez, notou que um outro professor da mesma fila, reconhecido no mundo como relapso, contador de anedotas, matador de aulas, enfim, justamente o contrário do que tinha sido o mestre que chegara primeiro, era recebido com melhor distinção.
Foi assim: Veio um anjo e confidenciou ao ouvido do relapso profissional: - Você deve encaminhar-se para a suíte presidencial, onde será atendido, com direito á eternidade de música suave e de outros encantos do paraíso.
Chegando a vez do professor certinho, o mesmo anjo veio dizer-lhe que, ao contrário do seu colega, ele deveria conformar-se em residir numa cela comum, com restrições ao conforto e sem qualquer mordomia.
De pronto, sem polêmicas, ele aceitou sua sorte, mas perguntou ao anjo: - Por que eu, sendo melhor, mais prestimoso e dedicado, recebo oferenda mais simples que o outro?
Respondeu o mensageiro: - Bem, caro educador, é que de grandes professores e inesquecíveis mestres o céu já está cheio. Mas, professores relapsos, alegres, não cumpridores dos seus deveres à risca, matadores de aula, raramente aponta um aqui. É natural que tenhamos de premiar a novidade.
Contextualização da anedota:
O céu é um lugar alegre e para ser assim precisa de novidades. Por outro lado, o primeiro já recebera parte de sua recompensa dos alunos, dos pais dos alunos, elogios de seus colegas e chefes, etc.
Mas o outro nada recebeu de bom, só castigos, embora tenha contribuído para a descontração da vida, lá no outro mundo. Certamente continuará a alegrar os céus.
Normalmente, os julgamentos não são entendidos, da mesma forma, pelas duas partes.
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Francisco Miguel de Moura, escritor brasileiro, fez uma leitura, interpretação e
reescrita do conto anedótico, com o propósito de mostrar os dois contextos: o céu e a terra. Não esqueceu, também, de considerar que os julgados são dois e o julgador, um só. Deus é por todos, mas o homem cada vez mais por si.
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Matéria colhida em "Casos, Fábulas e Anedotas", de Celso Antunes, Editora "Vozes", 2003, Petrópolis - RJ
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