quinta-feira, 10 de novembro de 2011

MEMÓRIA: CULTURA É LIBERTAÇÃO

PALESTRA NO CONSELHO ESTADUAL DE CULTURA - PI

Francisco Miguel de Moura*
  Escritor e ex-Conselheiro                                      
                                     
                                     “A presença de um pensamento é como a presença
                                     de quem se ama. Achamos que nunca esqueceremos
                                     esse pensamento e que nunca seremos indiferentes
                                     à nossa amada. Só que longe dos olhos, longe do
                                     coração! O mais belo pensamento corre o perigo
                                     de ser irremediavelmente esquecido quando não
                                                   é escrito, assim como a amada pode nos
                                                   abandonar se não nos casamos com ela”.
                                                                             Arthur Schopenhauer                        
        

Pensar é bom e rememorar também. Aqui, neste Conselho, eu me casei com a cultura, definitivamente. Como antes já me havia casado com a arte, a literatura.

Foi numa tarde de setembro de 1982 que eu me adentrei neste Conselho, por indicação do Prof. Paulo Nunes, então Secretário de Cultura do Estado Piauí, sendo Presidente do Conselho Estadual de Cultura, o Prof. Benjamin do Rego Monteiro Neto. Entre um e outro papel do Banco do Brasil, umas e outras contas a lançar no “diário” ou no “caixa”, escapei do trabalho burocrático por algumas horas e vim assumir uma suplência. Fiz o meu discurso de assunção com palavras vibrantes, ousadas, prometendo trabalhar pela cultura piauiense, com aquela disposição dos meus ainda 49 anos.

Pouco tempo depois, o Prof. Wilson de Andrade Brandão, já Secretário de Cultura, vem à minha presença, numa sexta-feira, para solicitar-me um artigo para o primeiro nº da revista Presença: - um trabalho de crítica sobre literatura. No seu jeito meio autoritário, disse ante minha primeira objeção: - “Pois que o faça no fim de semana, já que sua ocupação bancária não lhe dá folga”. 

Fiz o artigo, com a profundidade que meus conhecimentos permitiram, e tive a alegria de vê-lo estampado, com destaque, nas primeiras páginas da revista Presença inaugural.

Hoje, vejo que, daquele tempo para cá, tenho empregado minha vida útil com a cultura, a ponto de minha mulher dizer-me que eu só sei fazer isto: ler, escrever, ouvir e conversar sobre as atividades culturais. Aposentei-me do Banco do Brasil em 1983. Fui Conselheiro a partir de setembro de 1982 até fevereiro de 1990, sendo que nos cinco primeiros anos desse período como suplente sempre convocado a assumir e nos três últimos como titular. E, depois, continuei como membro efetivo, representando a Assembléia Legislativa, de l4.6.1995 a 30.6.1998, de 29.2.2000 a 29.2.2003, e ainda de março de 2003 a 30.6.2005.  Neste Conselho entrei com toda aquela liberdade de quem pode e quer fazer do seu tempo um trabalho social e ao mesmo tempo prazeroso: escrever, falar, comunicar, ler, cuidar das pautas do órgão, sempre pronto para aquelas tarefas a que fosse solicitado.  Aqui convivi com essa pessoa nobre e culta, conhecida de antes como referi acima, chamada Manoel Paulo Nunes, que assumiria a Presidência, depois de terminado o mandato do Prof. Benjamin do Rego Monteiro Neto.

Convivência mais proveitosa não poderia desejar, sempre nos encontrando nas quintas-feiras ou quando fosse necessário, discutindo os problemas que afligiam a cultura piauiense, desde os famosos tombamentos de prédios para o Patrimônio, até o cuidado com a manutenção das bibliotecas e arquivo público. Lembro-me de uma vez que fomos, eu e ele, Prof. Paulo Nunes, visitar a Biblioteca Pública Estadual, porque soubemos estar em péssimo estado de conservação, a fim solicitar do Governo a respectiva recuperação dos estragos e os cuidados com a manutenção do acervo.

Foram tantas coisas que falávamos e escrevíamos que já nem lembro da metade. Nas sessões, foram tantas as rememorações de datas públicas, de palestras sobre homens ilustres da terra e de fora. Muitos produtores de cultura e mestres em assuntos pertinentes foram convidados para palestras aqui, lembro da magistral fala do poeta-diplomata Alberto da Costa e Silva, dissertando sobre o patrimônio material e o patrimônio ideal das cidades do Brasil e do mundo. Entidades culturais aqui trouxeram suas paixões e problemas. Lembro-me, finalmente, da episódica tentativa de desmanche do Conselho Estadual de Cultura pelo recém-governo do PT.  Aí o Prof. Paulo Nunes, com seu jeito cordial e sincero, mas decidido, luta pela manutenção do nosso statu quo de órgão cultural independente. Levou o problema aos confrades da Academia Piauiense de Letras, contactou com deputados do governo e da oposição e, finalmente, conseguiu a situação de Conselho autônomo, na área da Secretaria de Educação e Cultura.

    Lembrando dessas lutas e de algumas vitórias é que, hoje, falamos no palco deste Centro Cultural da Vermelha, justamente denominado “Prof. Manoel Paulo Nunes”, pois é obra do seu trabalho incansável de criador de espaços para o desenvolvimento cultural, assim como foi o revitalizador do próprio Conselho Estadual de Cultura e da revista Presença, ambos já existentes, porém com desempenho inferior ao desejado. Hoje a Revista e o Conselho são considerados os melhores e mais ativos do Brasil, com razão. Por isto e por mais algumas coisas é que João Cláudio, nosso grande humorista, declarou à imprensa que, daqueles tempos para cá, nós (da cultura) melhoramos, o Piauí – não. A quem atribuir a culpa?   Não nos cabe, neste momento, apontar este ou aquele, isto ou aquilo.

           Nesta manhã, neste simpático espaço, diante do Presidente do Conselho Estadual de Cultura – lembro alguns companheiros que por aqui passaram: o poeta Luiz Lopes Sobrinho, o historiador e professor Camilo Filho, o médico Dr. Zenon Rocha, os professores Leopoldo Portela, Noé Mendes de Oliveira e Walda Neiva de Moura Leite, todos de saudosa memória, para citar apenas os falecidos. Os demais, sem dúvida, estão nomeados na história do Conselho de Cultura que o Prof. Paulo Nunes solicitou que a escrevesse – a mim, que nunca tinha sido historiador.     
     
Durante aqueles anos, a convivência foi tão boa que este “menino quase perdido” saiu quase a derramar lágrimas de saudade antecipada. Constato, pois, que daqui saí mais rico de vivência e de tudo o que vi, ouvi e li, de tudo que fiz e do que quis fazer e não pude.

          Por tudo isto me considero pago. E faria tudo de novo, se idade, força e saúde me houvessem ainda, desde que com os dois por sustentáculos: – o Conselho Estadual de Cultura e o mestre Paulo Nunes, crítico literário dos mais cultos e percucientes, uma personalidade das mais íntegras que conheci. 
__________
'*Conselho Estadual de Cultura – Centro Cultural da Vermelha - Teresina, PI, 13 de outubro de 2011.
                            Palestrante: FRANCISCO MIGUEL DE MOURA
  

2 comentários:

Gisa disse...

Agradeço o teu casamento com a cultura. Aproveito sempre essa festa de núpcias! Um grande bj querido amigo

CHIICO MIGUEL disse...

Amiga Gisa:
Casamento com a cultura - diga-se mais especificamente - com a poesia, que até minha mulher às vezes tem ciúme. E você, se não tem, é porque
também é poeta em versos e em pessoa.
Grato por ambas.
Abraço do lado esquerdo
francisco miguel

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