domingo, 18 de setembro de 2011

ASPECTOS DA POESIA PARNAIBANA

Elmar Carvalho*

I INTRODUÇÃO

Hoje se presta uma das maiores homenagens aos poetas e à poesia, que na observação do poeta italiano Eugénio Montale, citado pelo professor Paulo Nunes, é a mais discreta das artes. Diria que é a mais discreta e a mais pálida das manifestações artísticas, mas nem por isso a menos importante, porquanto é a mais cara aos que amam as idéias consubstanciadas na emoção e na estética. A homenagem é o soerguimento de um jardim público, um verdadeiro monumento e memorial, denominado Jardim dos poetas.
A poesia foi de capital importância no passado, porque antes da invenção da escrita, ela era a guardiã da História, pois a sua beleza facilitava a memorização. Nessa época os aedos perambulavam por diferentes paragens, levando o belo das palavras e da voz ritmicamente modulada.
Poeta é sinônimo, também, de vate, e vate é aquele que faz vaticínios, que profere profecias. É, pois, o poeta o profeta dos tempos hodiernos, seja antecipando o futuro através de sua sensibilidade e intuição, seja um profeta extraído das páginas da bíblia, a imprecar contra a corrupção e contra os desmandos dos desvios da política com p minúsculo.
Cabe-nos agradecer ao prefeito Paulo Eudes a criação deste jardim, que em boa hora presta homenagem aos poetas e à poesia, que se quedavam quase anônimos, numa época em que as pessoas se tornaram escravas da mídia avassaladora da televisão, que nos impõe dejetos e excrescências como os “ratinhos” e os “bigs brothers” da vida, com toda a sua corte de exemplos do que não deve ser seguido, em que as pessoas incautas se demitem do seu sagrado direito de viver e conviver, para curtirem a convivência televisiva dos que se tornam famosos por nada, como disse uma revista de circulação nacional. Ressalto que o prefeito, sabiamente, agiu sob a benéfica inspiração do intelectual Benjamim Lima dos Santos, que ombreado ao saudoso Francisco Pereira da Silva, campomaiorense, é o maior teatrólogo do Piauí.

II PRINCIPAIS PERIÓDICOS E LIVROS QUE DIVULGARAM A POESIA PARNAIBANA

Um dos principais periódicos a divulgar a literatura e a poesia de Parnaíba foi o Almanaque da Parnaíba, fundado por Benedito dos Santos Lima, o Bembém, pai do já mencionado dramaturgo Benjamim Lima dos Santos e da escritora Sólima Genuína dos Santos. Na fase em que esteve sob a direção de seu fundador, o Almanaque circulou de 1924 até 1941. Sob a responsabilidade de Ranulfo Torres Raposo foi dado à estampa de 1942 a 1981. Manuel Domingos Neto, de quem Ranulfo era avô, editou os números relativos a 1982 e 1985, no qual funcionei como editor assistente, juntamente com sua irmã Maria Florice. Na quarta e atual fase passou para a responsabilidade da Academia Parnaibana de Letras - APAL, que publicou as edições referentes aos anos de 1994 a 1999 (seis números), sendo que agora, em convênio com o Banco do Nordeste , trabalha para editar os números relativos aos anos de 2000 e 2001. Além de anuários e dados estatísticos diversos, esse periódico tornou-se um importante repositório da cultura, da história e da literatura de Parnaíba, tendo importantes literatos publicado contos, crônicas e poemas em suas páginas. É, ao que parece, o mais antigo almanaque em circulação no país. Hoje, despojado de dados astrológicos, calendários e charadas, constitui-se como uma revista da APAL, e é a mais importante revista cultural do norte do Piauí.
Quando fui morar em Parnaíba, em meados de 1975, funcionava o jornal Folha do Litoral, por trás da igreja do Rosário, na frente do bar Parnaíba. O hebdomadário pertencia ao grupo político dos Silva (Dr. João e Alberto Silva). Era dirigido pelo jornalista Batista Leão e gerenciado por Batistinha. Lembro-me que fazia a sua composição tipográfica, de forma totalmente artesanal, tipo por tipo, cada tipo uma letra, o “compositor” Xixinó. Mas, apesar dessa tecnologia rudimentar, ostentava bonita apresentação gráfica. Faziam parte da equipe os jornalistas Antônio Gallas Pimentel, B. Silva, e o hoje decano Rubem da Páscoa Freitas, sempre o rei do colunismo social. Publicava poemas e eu mesmo fui um desses colaboradores poéticos.
Nessa mesma época, também circulava o jornal Norte do Piauí. Impresso pelo sistema de linotipia, era seu proprietário o jornalista Mário Meireles, tendo como um dos diretores o falecido vereador Arimatéia Carvalho. Ainda hoje se encontra em funcionamento, tendo o mesmo proprietário na sua direção. Também aceitava colaborações poéticas, sendo um dos seus mais destacados colaboradores nessa área o jornalista Fonseca Mendes.
O jornal mimeografado O Linguinha foi fundado, em julho de 1971, por Elmano Carvalho, Gervásio de Castro Neto e Alcenor Candeira Filho. Segundo Alcenor, em seu importante trabalho “O Produto Cultural Alternativo dos Anos 70 em Parnaíba”, os seus fundadores “idealizaram um jornal que, agressivo e marginal, deveria espelhar os anseios da juventude parnaibana, inconformada com tudo e com todos”. Entretanto, o primeiro número só saiu no apagar das luzes de 1971, tendo como colaboradores Bruno Pires, Elias Prado Jr., Renato Machado, Alcenor Candeira Filho, Antônio Oliveira Neto, Luís Prado Jr. e William Gennison. A seguinte quadrinha, estampada nesse jornal, bem lhe poderia servir de slogan:
O Linguinha é um jornal
que talvez não valha nada,
mas em tudo o que vai mal,
quando pode, dá porrada.

Quando o jornal passou a tomar posições mais radicais e mais virulentas, perdeu o apoio inicial, inclusive do SESC. Passou, então, a ser mimeografado no SESI, graças ao incentivo do superintendente, professor Benedito Jonas Correia. Circulou de dezembro de 1971 a janeiro de 1973. Até prova em contrário e até onde se sabe, foi o primeiro jornal alternativo e mimeografado do Estado do Piauí.
O Grupo Abertura Força Jovem, cuja diretoria era composta por Olavo Rebelo Filho (presidente), Paulo de Athayde Couto (vice-presidente), Elmar Carvalho (secretário) e Francisco Filho (tesoureiro), editou o jornal Abertura, que, além de informativo e opinativo, era cultural, e dessa forma também difundia a poesia parnaibana.
O Querela, fundado por Fernando Ferraz, tinha como principais colaboradores Paulo Couto, Acanto Francelli, Ednólia Fontenele, Flamarion Mesquita, Bernardo Silva, Elmar Carvalho, Acácia Castelo Branco, Cândido de Almeida Athayde e Raimundo Fonseca Mendes. Também era lítero-cultural. Impresso na gráfica do pai de seu fundador, circulava na época das férias escolares, e teve duração efêmera. Divulgava, sobretudo, poemas, crônicas, artigos e charges.
Como já afirmei no meu ensaio “Jornal Inovação – Um Depoimento”, esse periódico “foi, sem sombra de dúvida, o mais consistente e mais duradouro jornal alternativo a circular em terra piauiense, pois o seu primeiro número foi lançado em dezembro de 1977 e o último, em janeiro/fevereiro de 1992, numa edição especial e extemporânea, que foi na verdade o seu canto de cisne”. No importante livro “Aspectos da Literatura Piauiense”, de Alcenor Candeira Filho, está consignado que “o Movimento Social e Cultural Inovação foi oficializado no dia 15 de janeiro de 1978, ocasião em que importantes figurões do MDB se fizeram presentes: o prefeito João Batista Ferreira da Silva (...), o vice-prefeito Roberto Broder, o ex-prefeito José Alexandre Caldas Rodrigues, o deputado federal Celso Barros Coelho, o presi dente regional do MDB João Mendes Nepomuceno, o presidente da ACEP Francisco José Martins Jurity, o poeta Elmar Carvalho (...) e os jornalistas Reginaldo Costa e Francisco José Ribeiro”. Seu número inaugural já denunciava a carência cultural de Parnaíba, com a falta de bibliotecas e de espaços culturais. O Reginaldo Costa, seu fundador ao lado de Francisco José (Franzé) Ribeiro, era seu diretor, redator, diagramador; em suma, era um verdadeiro faz-tudo. Varava dias e noites preparando as edições. Ostentava, orgulhosamente, o slogan de “um jornal sem colunista social”. Sem dúvida, vem daí a ojeriza, senão mesmo o ódio, que lhe votavam os colunistas sociais. Foi uma verdadeira metralhadora giratória a atirar contra os desmandos e mazelas da administração pública, tanto da esfera federal, como estadual e municipal. Informativo e opinativo, também divulgava contos, crônicas, crítica s literárias e poemas, além de dar à estampa charges, cartuns, quadrinhos e ilustrações fotográficas. Promovia pesquisas, para discussão dos principais problemas do município. Produziu debates e palestras, de natureza social e cultural. Manteve durante alguns anos uma biblioteca, no centro da cidade. Provocou uma verdadeira revolução cultural em Parnaíba, congregando jovens literatos, e publicando-lhes os textos, que de outra maneira repousariam nas gavetas e baús. Sob seu influxo e apoio, surgiram vários jornais alternativos, que lhe gravitavam em derredor. Foi o mais belo projeto lítero-cultural jamais visto em plagas parnaibanas. Os principais e mais assíduos colaboradores do jornal estão citados no espaço destinado ao Movimento Cultural e Social Inovação.
Vários livros não voltados especificamente para Parnaíba, escritos ou organizados por não parnaibanos, contemplaram poetas dessa cidade amada. Entre eles, como uma simples amostragem, listaríamos os seguintes: Literatura Piauiense para Estudantes, de Adrião Neto, importante obra didática, quiçá, pelo grande número de reedições, a mais significativa obra de divulgação de nossa literatura, bastante rigorosa e avara na escolha dos autores estudados, evidencia os seguintes escritores e poetas parnaibanos: Ovídio Saraiva de Carvalho e Silva, Renato Castelo Branco, Assis Brasil, Alcenor Candeira Filho e Elmar Carvalho; em Baião de Todos, excelente antologia poética contemporânea, organizada pelo professor, escritor e editor Cineas Santos, através de sua editora Corisco, figuram os poetas Alcenor, Fernando Ferraz e este escriba; e no Presença da Literatura Piauiense nos Vestibulares, do professor e crítico literário Luiz Romero, mestre respeitado, autoridade na matéria, marcam presença os escritores Ovídio Saraiva, Renato Castelo Branco, Assis Brasil e Elmar Carvalho. Todos esses poetas e escritores são citados e/ou estudados em dezenas de obras de teoria, história e crítica literárias, além de serem verbetes em diversos dicionários biográficos, e até mesmo em enciclopédias.
Tratarei, a seguir, de livros escritos por parnaibanos e/ou exclusivamente direcionados para a poesia de Parnaíba:
Poemágico – a nova alquimia foi talvez a mais importante antologia de autores parnaibanos, pela qualidade de quase todos os poemas nela inseridos. Tanto isso é verdade, que o grande crítico e escritor Assis Brasil, notável parnaibano, dela disse em fundamentada e pertinente judicatura literária, referindo-se aos autores: “cinco grandes vozes atuantes e atualizadas em relação ao processo cultural e literário. Todos eles falam a linguagem do seu tempo e dominam a estética de sua época, através de alguns dos melhores poemas da modernidade”. Essa afirmativa data de 1985, pois foi proferida no prefácio dessa coletânea, editada nesse ano. Dada a importância que lhe deve ter conferido, e por achá-lo ainda válido e pertinente, seu autor inseriu esse texto, primitivamente concebido como preâmbulo, no seu livro Te oria e Prática da Crítica Literária. Assis Brasil observava que os poetas, embora vivessem e mourejassem na província, encontravam-se atualizados em relação ao que se fazia nos eixos culturais do país. O livro, além de textos líricos e sociais, trazia vários poemas em que o povo e a terra parnaibana eram cantados. Participam da antologia os poetas Paulo Veras (falecido), Alcenor Candeira Filho, V. de Araújo, Jorge Carvalho e Elmar Carvalho.
Poemarít(i)mos, coletânea poética publicada em 1988, traz poemas dos cinco autores de Poemágico, excetuando-se Paulo Véras, e mais os dos seguintes poetas: José Pinheiro de Carvalho Filho, Danilo de Melo Souza, Pádua Santos, Adrião Neto, Carlos Marinho, Fernando Ferraz, Ednólia Fontenele, Fernando Almeida, Flávio Neri, José do Egito, Paulo Henrique, Cristina Melo, Edson Rocha, Pedro Silva, Wilton Porto, Socorro Meireles e Antônia Alves de Souza. Alguns desses poetas continuaram produzindo, levantando carreira solo, enquanto outros eram plumitivos diletantes, que não alçaram vôo. Era uma obra bastante desigual, sem quase nenhuma unidade, onde se encontram poemas de alto nível, ao lado de outros bem precários. Foi exatamente por isso, que dela disse Renato Castelo Branco, o seu prefaciador: “É claro que uma a ntologia tão ampla teria que ser heterogênea. Diria, até mesmo, que este livro ganharia se fosse feita uma seleção mais rigorosa de alguns dos poemas que o compõe”.
A antologia A Poesia Piauiense no Século XX, publicada em 1995 pela Fundação Cultural Monsenhor Chaves – FCMC, órgão da Prefeitura Municipal de Teresina, em parceria com a editora Imago, é no meu entendimento a mais importante obra no gênero. Traz um longo estudo introdutório, que se constitui em verdadeiro ensaio, em que o autor envereda pela teoria literária, pela historiografia de nossa literatura e em que são feitas eruditas observações críticas. Cada autor é antecedido de substancial nota biográfica, com considerações críticas e outras. É uma edição bem cuidada, com ótima apresentação gráfica, em que foi feita uma rigorosa seleção de autores. Dessa antologia participam os seguintes autores parnaibanos: Jonas da Silva, R. Petit, Renato Castelo Branco, Alcenor Candeira Filho, V. de Araújo, Jorg e Carvalho, Paulo Véras, Israel Correia, Elmar Carvalho, Ednólia Fontenele e Danilo Melo.
Graças ao interesse do amigo Eliseu Fernandes Monteiro Filho (o Tourinho), foi publicada, em 2001, através do governo do Estado, uma antologia, por mim idealizada, denominada A Poesia Parnaibana. Acredito ser a mais importante obra de resgate da poesia parnaibana, porque traz autores do passado, que jaziam no mais completo abandono e esquecimento, ao lado de outros, vivos, que também estavam imersos na sombra, pela falta de oportunidade editorial. Os autores foram escolhidos de forma criteriosa, por uma espécie de conselho editorial, em que se levou em consideração a atividade literária do poeta, a sua produção em termos qualitativo, o seu aparecimento em obras sobre literatura, a sua fortuna crítica, e outros itens. A coletânea traz notas biobibliográficas de Adrião Neto, dois ensaios de Alcenor Candeira Filho (A Moderna Poesia Parnaibana e O Produto Cultural Alternativo dos Anos 70 em Parnaíba) e um de Elmar Carvalho (Jornal Inovação – Um Depoimento).
Também merecem ser citados aqui, porque divulgaram bem alto e bem forte a poesia parnaibana, os livros Galopando, Em Três Tempos, Nuvem, Poesia do Campus e Salada Seleta. O primeiro, com capa do saudoso artista plástico Fernando Costa, que, tragicamente, veio a suicidar-se, a golpes de estilete, que era um dos seus instrumentos de trabalho, num domingo de carnaval do ano de 1987, encontrando talvez o seu vermelho fundamental, ele que buscava o azul fundamental, constava de poemas de três autores teresinenses (Josemar Nerys, Paulo Machado e Rubervam Du Nascimento) e de dois parnaibanos (Paulo Couto e eu), o que denotava o forte intercâmbio cultural que havia na época entre Teresina e Parnaíba. Foram publicados nos anos 70, todos artesanalmente, por intermédio de mimeógrafo. Como fiz parte de todos eles, exceto Nuvem, prefiro deixar que fale o mestre Alcenor Candeira Filho, tomando por base esses livros e também os jornais O Linguinha, Inovação, A Ação e Querela: “podemos lembrar como representantes da nova poesia parnaibana Elmar Carvalho, Ednólia Fontenele, Paulo de Athayde Couto, Fernando Ferraz, Jorge Carvalho, V. de Araújo e Paulo Veras, poetas que, conscientes da realidade objetiva e subjetiva do mundo que os circunda, vêm construindo novos comunicantes, em forma de poesia, convertendo-se em agentes coordenadores de ação artística, vinculada à evolução da comunidade. E assim esses poetas, ao lado de poucos outros, produzem a cada instante e de um modo atual conceitos adequados ao momento presenteado. Como curiosidade e como lembrança de um tempo que foi culturalmente talvez o mais importante para Parnaíba, assinalo que a capa e a contracapa do Salada Seleta foram elaboradas por Bartolomeu Martins e Flamarion Mesquita (que fizeram outras capas de livros e ilustrações para quase todos os jornais mencionados acima), e que os seus autores ajudaram a compor a paginação do opúsculo, folha por folha. Airton Menezes foi um dos poetas de Nuvem, embora não seja nenhum nefelibata e nem plumitivo, e Kenard Kruel foi um dos “tempos” de Em Três Tempos, que ele próprio editou.

III ENTIDADES E GRUPOS LÍTERO-CULTURAIS DE PARNAÍBA

A Academia Parnaibana de Letras – APAL foi idealizada por José Pinheiro de Carvalho, que foi seu fundador, juntamente com os escritores Fontes Ibiapina, Maria da Penha Fontes e Silva, Alcenor Candeira Filho, Fonseca Mendes e Anchieta Mendes, conforme consta na ata de fundação, datada de 28.07.83. Foi instalada em 19 de outubro desse ano, em sessão solene, contando inicialmente com 30 membros, hoje aumentados para 35. Visa a promover a cultura, o estudo da Língua Portuguesa, a fomentação e promoção das artes em geral e da literatura, primordialmente, sobretudo a literatura parnaibana. Publica anualmente o Almanaque da Parnaíba, que é a sua revista cultural e informativa. Tem promovido palestras e lançamento de livros. Mantém uma biblioteca. Possui sede própria, localizada na rua Alcenor Candeira, perto da Praça da Graça. Seu primeiro presidente foi Fontes Ibiapina. Foi presidida durante vários anos pelo historiador Lauro Correia, que teve sempre como secretário-geral e “braço direito” o poeta Alcenor Candeira Filho. Hoje seu presidente é o escritor e poeta Anchieta Mendes.
A Associação Parnaibana de Letras foi fundada em 01.01.1949 e tinha por finalidade precípua o estudo da língua, da literatura, da história e dos problemas nacionais. O ingresso na entidade era feito por intermédio de pedido do postulante, cuja petição era analisada pelo Conselho Consultivo, que em quinze dias emitia parecer. Seu presidente de honra (perpétuo) era o poeta Alarico da Cunha. Seu primeiro presidente foi Tomás Leite Neto. Foram sócios, entre outros: Fonseca Mendes, João Paulo Veloso, Antero Cardoso Filho, Benedito Jonas Correia e Lauro Andrade Correia. Seu órgão de comunicação era “O Arauto”.
Nos anos 70, com a finalidade de promover e disseminar a cultura, sobretudo a literária, foi criada, em Parnaíba, a Fundação Cultural Assis Brasil, como forma também de homenagem a esse importante autor parnaibano, consagrado nacionalmente. Essa entidade, idealizada por Ednólia Fontenele, Luzanira Silva, Airton Menezes e outros, mantém uma biblioteca no centro da cidade.
Criada em 26.05.1995, pelo esforço de sua família, a Fundação Raul Furtado Bacelar tem entre seus objetivos estimular e promover projetos culturais, educacionais, científicos e filantrópicos. O seu patrono, nascido em Brejo – MA, em 1891, e falecido em 1996, em Parnaíba, na época de sua morte era o decano dos farmacêuticos do Brasil. Tive a oportunidade e a honra de entrevistá-lo para o jornal Inovação, do qual era simpatizante. A entidade tem entre seu patrimônio a Farmácia do Povo, que realmente fazia manipulação de medicamentos, transformada em “museu vivo”, e um espaço cultural, localizado na casa onde residiu o Dr. Raul Bacelar, no início da rua Vera Cruz.
Na década de oitenta, um grupo de onze jovens fundou o Grupo Experimental de Poesia a Veiz do Ônzimo. Reunia-se para recitar poemas, discutir literatura e outros assuntos culturais, organizar recitais, etc. Publicou algumas edições do jornal lítero-cultural “Litoral News”, impresso em off-set, bem diagramado, com ilustrações, e que, a cada edição, homenageava um poeta, com uma página com poemas ilustrados. Seus componentes participaram do livro Poemarít(i)mos.
O Diretório Acadêmico 3 de Março é a entidade de representação do corpo discente dos vários cursos do Campus Ministro Reis Veloso. Portanto, cabe-lhe desenvolver atividades reivindicatórias e de lutar pela melhoria do ensino, além de promover eventos culturais, esportivos e outros. Por ser comprometido com a cultura, especialmente com a poesia, quando tive a honra de presidi-lo, dinamizei, no que pude, a área cultural, tendo contado com o apoio logístico e moral do jornal Inovação. A minha gestão promoveu vários debates, ciclos de palestras e até mesmo um festival de música. Publiquei cartaz de poemas e o livro Poesia do Campus, que divulgaram os textos de poetas do Campus Ministro Reis Veloso. Tenho conhecimento de que a gestão do poeta Danilo Melo também atuou bem no setor cultural, sem prejuízo da contribuição de outras administrações, que inclusive, algumas delas, chegaram a manter jornal informativo e cultural.
O Movimento Social e Cultural Inovação foi fundado em 15 de janeiro de 1978, conforme comentado no trecho relativo ao jornal Inovação, por Reginaldo Costa e Francisco José Ribeiro (Franzé), em solenidade a que compareceram pessoas gradas de Parnaíba, tanto no aspecto cultural como político. O partido de oposição MDB, através de seus próceres, se fez presente. Se mais nada tivesse feito, esse Grupo já se justificava plenamente pela simples manutenção do jornal Inovação, o mais glorioso alternativo de Parnaíba e mesmo do Piauí. Promoveu debates e palestras. Patrocinou pesquisas voltadas para aspectos econômicos e sociais do município. Incentivou e apoiou o surgimento de outros jornais alternativos. Manteve biblioteca. Realizou reuniões políticas na periferia da cidade e na zona rural. Possibilitou a vinda de Luís Inácio Lula da Silva, no início do PT, quando o hoje presidente da República participou de comício na Praça da Guarita. Lula hospedou-se na casa do Reginaldo Costa, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores em Parnaíba. Fizeram parte do Movimento e foram colaboradores do jornal Inovação, entre outros, os seguintes intelectuais parnaibanos: Canindé Correia, Vicente de Paula, Elmar Carvalho, Mário Carvalho, João Maria Madeira Basto, Olavo Rebelo, Diderot Mavignier, Ednólia Fontenele, Paulo Couto, Airton Menezes, Israel Correia, B. Silva, Ana Alice, Danilo Melo, Jonas Carvalho, Francisco Fontenele de Carvalho (Neco), Sólima Genuína dos Santos, além dos fundadores, é claro.
A Sociedade Parnaibana de Expansão Cultural foi fundada em 15.11.1948. Tinha, inicialmente, um quadro de 22 sócios efetivos. Propugnava pelo desenvolvimento das letras, das ciências e das artes. Foi idealizada por Edison da Paz Cunha. As reuniões aconteciam no salão de leitura da Biblioteca Pública Municipal, então localizada na Praça da Graça. Em 1952, a entidade possuía 31 membros efetivos e 20 sócios por correspondência. Fazia circular a revista “Cultura”. Entre outros, teve os seguintes membros: Antônio Monteiro de Sampaio (padre), Alberto Tavares Silva, Cândido Athayde, Edison da Paz Cunha, Heráclito Sousa, Heitor Araripe de Sousa, João Silva Filho, José Euclides de Miranda, Joel de Oliveira, José Pinheiro Machado, Mariano Lucas de Sousa, Walterdes Sampaio.
O Grêmio Literário Savina Petrilli foi fundado por alunas do Colégio Nossa Senhora das Graças, em 03.05.1938, e tinha finalidade lítero-cultural. Publicou um pequeno jornal denominado 04 de Outubro. Posteriormente, editou a revista Raio de Luz. Fizeram parte da primeira diretoria, entre outras, as seguintes alunas: Maria Santana Pinto (presidente), Gladis Luffi, Maria Monteiro Sampaio, Nilza Brito, Zélia Fonseca Pinto, Florice Torres Raposo e Maria da Penha Fonte e Silva, cognominada a Divina Mestra. Publicaram textos na revista, dentre outras colaboradoras: Aldenora Aguiar, Maria do Socorro de Freitas Costa, Helenita Freitas, Ione Pessoa Sousa, Bernarda Monteiro, Maria José Pinho (além das referidas Maria da Penha e Florice).
Merece registro em destaque o Teatro de Amadores de Parnaíba, sobre o qual assim se pronunciou Adrião Neto: “Em 1972, dona Maria Bittencourt Lopes, conhecida no meio artístico como dona Maroquinha, sentindo a necessidade de expandir as suas atividades para fora da área do SESC, transformou o Grêmio Ranulfo Torres Raposo em Teatro de Amadores de Parnaíba”. O TAP foi reconhecido como de utilidade pública, por lei municipal de 01.10.75. Esse grupo, entre outras, encenou as seguintes peças: Paixão de Cristo, Só Luxa Quem Pode, Universitário Morre às Oito, e O Bem Amado. Nesse grupo atuaram vários atores e intelectuais parnaibanos.
Sobretudo ligados ao teatro, existiram em Parnaíba várias agremiações que desenvolviam atividades culturais. A maioria de duração efêmera e de atuação pouco marcante, algumas prestaram relevantes serviços na sua área de atuação. Podem ser citadas, dentre outras: Associação dos Artistas e Técnicos de Parnaíba, Grêmio Lítero Dramático Jonas da Silva (fundado na década de 20, por Luís Torres Raposo, também fundador do Jornal do Comercio), Grêmio Literário Coelho Neto (fundado nos anos 20, tendo como líderes Euvaldo Mendes, Antônio Martins Castelo Branco e Miguel Soares de Oliveira), Recreio Dramático de Parnaíba (fundado em 1918 e dirigido por Eurico Cabral), Grêmio Teatral Ranulfo Torres Raposo, Grupo Experimental de Teatro do SESC – GET-SESC, Grupo Palco da Vida, Grupo Parnaibano de Comédia, Grupo Parnaibano de Teatro, Grupo de Teatro do SESI – GRUTESI. Na ativ idade teatral parnaibana, importa salientar que as pessoas que mais se destacaram, pela dedicação e constância, seja como ator, diretor ou autor, foram: Maria Bittencourt Lopes (Maroquinha), Fernando Almeida, José do Egito, Deusimar Castro, Zezinho (Humberto Alencar), Batista Caldas, Carlos Marinho, Luís Torres Raposo, José Guido, Jairo Lima, Fernanda Melo, Cléia Veras, Mauro Holanda, José Galas Filho, Jesum Messias e o grande Tarciso Prado, que foi, recentemente, o protagonista do filme Cipriano. Lembro, ainda, Paulo Libório, ator e diretor respeitado, professor da Escola Técnica Federal do Piauí e da Universidade Federal do Piauí. Benjamim Lima dos Santos mereceria um estudo à parte, porque ele, ao lado do campomaiorense Francisco Pereira da Silva, é o mais proeminente dramaturgo do Piauí.
Por dever de justiça, registro que órgãos estatais, paraestatais e privados, como Prefeitura, Associação Comercial, SESC e SESI, contribuíram para o engrandecimento da cultura e das manifestações artísticas de Parnaíba, seja direta, seja indiretamente, através de ajuda financeira, material, ou pela cessão de seus prédios e equipamentos.
Maiores informações poderão ser obtidas no “Dicionário Biográfico Escritores Piauienses de Todos os Tempos”, de Adrião Neto, e no livro “História do Teatro em Parnaíba – 1898 a 1999”, de Rozenilda Castro, editado pelo SESC-PI, em 2000.

IV O ENSINO DE LITERATURA PIAUIENSE E PARNAIBANA

Entrego a palavra, inicialmente, ao escritor e historiador Adrião Neto: “A diretoria da União Brasileira de Escritores do Piauí – UBE/PI, gestão 88/90, que tinha como presidente o escritor José Elmar de Mélo Carvalho, tendo constatado que a Literatura Piauiense era desconhecida até mesmo entre alunos e professores, resolveu empreender significativa campanha para que a Assembléia Estadual Constituinte incluísse, no texto constitucional, um dispositivo determinando a obrigatoriedade do ensino de nossa literatura nas escolas de 1º, 2º e 3º graus. A campanha aconteceu através da imprensa, de contatos com parlamentares e mediante emenda de iniciativa popular, com um abaixo assinado contendo mais de 500 assinaturas”. Retomando a palavra, ressalto o empenho do deputado Humberto Reis da Silveira, que na qualidade de relator geral da Constituinte empregou todo o seu esforço e capacidade de articulação no sentido de que a justa e importante reivindicação da UBE-PI fosse aprovada. Dessa forma, encontra-se na Constituição Estadual, datada de 05 de outubro de 1989, o artigo 226, que merece transcrição integral, com a nova redação dada pela Emenda Constitucional nº 09, de 17.12.99:

Art. 226 – A lei estabelecerá o plano estadual de educação, de duração plurianual, visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis e à integração das ações do Poder Público que conduzam:
I – à erradicação do analfabetismo;
II – à universalização do atendimento escolar;
III – à melhoria da qualidade do ensino;
IV – ao conhecimento da realidade piauiense, através de sua literatura, história e geografia;
V – à preparação do educando para o exercício da cidadania.
§ 1º - Será obrigatório, nas escolas públicas e particulares, o ensino de literatura piauiense e a promoção, no âmbito de disciplina pertinente, do aprendizado de meio ambiente, saúde, ética, educação sexual, direito do consumidor, pluralidade cultural e legislação de trânsito.
§ 2º - Compete à Secretaria de Educação do Estado do Piauí, fazer constar dos programas de ensino fundamental e médio, direcionamento e delimitação quanto aos conhecimentos teóricos dos temas referidos no parágrafo anterior, na forma da lei.

Passados mais de 23 (vinte e três) anos da promulgação da Carta Magna estadual, nunca o ensino de literatura piauiense foi efetivamente implementado, nunca foi colocado em prática, nem tampouco foi elaborada lei ordinária regendo a matéria, restando o artigo da Constituição como verdadeira letra morta, nessa parte. Deixo para o leitor o julgamento, quanto às outras disposições do artigo. Como diria Boris Casoy, é uma vergonha!
Lembro-me de um episódio de minha infância, que bem me fez, posteriormente, avaliar o quanto é importante o ensino de nossa literatura nas escolas. Acostumado com os grandes autores nacionais, ouvi em sala de aula a leitura, feita pela professora, do poema Moenda, de nosso excelso poeta Da Costa e Silva. Tomado de forte emoção, fiquei admirado de que um dos nossos poetas tivesse tamanha grandeza. Verifiquei, então, como era importante o conhecimento de nossos grandes poetas e escritores, razão pela qual luto até hoje no sentido de que o mandamento constitucional, no que pertine à nossa literatura, seja cumprido.
A implantação do ensino de Literatura Piauiense não vai requerer grandes esforços, pois bastaria um treinamento e/ou reciclagem de férias aos professores da área de literatura, cujo treinamento poderia ser ministrado por outros professores mais versados na matéria, e por intelectuais que têm se dedicado ao assunto. O certo é que o que não falta são os chamados recursos humanos. Quanto aos livros, vários foram publicados, abordando a disciplina, em sua generalidade ou em aspectos específicos, desde o seu início aos dias atuais, ou em cortes cronológicos restritos. Além de outros autores, escreveram sobre a matéria: João Pinheiro, M. Paulo Nunes, Luiz Romero, Teresinha Queiroz, Alcenor Candeira Filho, Francisco Miguel de Moura, Herculano Moraes, Ronaldo Mousinho, Adrião Neto e Socorro Rios Magalhães. Esses autores, ou alguns deles, poderiam compor uma comissão de alto nível, instituída pelo Go verno Estadual, que elaborasse o programa da disciplina e listasse os autores que deveriam ser objeto de estudo.
Com relação ao ensino de Literatura Piauiense, em Teresina e em algumas outras cidades, é feito por alguns colégios, principalmente particulares, graças ao interesse e zelo de alguns abnegados diretores e professores, que procuram respeitar e acatar a vontade do Constituinte e o espírito do artigo acima transcrito.
Por outra parte, como nos exames vestibulares as comissões organizadoras das várias entidades de ensino superior sempre colocam no programa dois ou três escritores, quase sempre ou indefectivelmente os mesmos, os cursinhos de pré-vestibular ensinam literatura piauiense, no pertinente apenas a esses autores, na corrida desenfreada em busca da obtenção de melhor ranking no número de alunos aprovados.
Quanto ao ensino de Literatura Parnaibana tem sido feito de forma tímida, em alguns colégios deste município, através de palestras e esporádicas aulas. Louve-se o esforço de alguns poucos professores, como Luzanira Silva, que fez o que pôde na década de 80; como Alcenor Candeira Filho, que tem envidado grandes esforços nesse sentido, através de palestras e em apresentação de livros, e até mesmo em sala de aula, tendo mesmo chegado a escrever livros sobre o assunto. Ressalte-se, mais recentemente, a luta da professora Rossana Silva, que tem promovido a literatura piauiense e parnaibana, tanto em sala de aula, como através de performances de atores da cidade, em que os poemas são teatralizados, tendo também escrito acerca da matéria.
O que se deseja é que o dispositivo constitucional passe a ser realmente cumprido, que a lei ordinária seja elaborada, e que a Literatura Piauiense passe realmente a ser ministrada nas escolas, e fazendo parte integrante dessa disciplina, pela sua grandeza e pujança, seja também ensinada a nossa literatura parnaibana.

V ALGUNS POETAS PARNAIBANOS

Inicialmente, quero transcrever, nesta parte, o que já disse no meu trabalho “Jornal Inovação – Um Depoimento”: “É preciso que se diga e agora vou dizer, sem vaidade, mas também sem falsa modéstia: antes de Alcenor Candeira Filho, com seus dois livros (“Sombra entre Ruínas” e “Rosas e Pedras”), impressos em mimeógrafo, pioneiros, inclusive em termos de Piauí, da utilização desse equipamento na confecção de livros, que passou a designar uma geração literária, deste escriba e do poeta V. de Araújo, ambos com poemas publicados, ainda nos idos de 1977/1978, nas páginas de “Folha do Litoral”, o que se via em Parnaíba eram poemas obsoletos e formalmente ultrapassados, sobretudo sonetos de cunho parnasiano, escola já destroçada em 1922, pelo movimento dos modernistas, mas cujos influxos ainda não haviam chegado a Parnaíba, ao menos publicamente, através de livros e jornais. Nã o mencionei o nome de Renato Castelo Branco em virtude de este notável escritor e poeta ter-se radicado em São Paulo há muitos anos e não haver publicado seus poemas modernistas em nossa “Princesa do Igaraçu”. Com o surgimento do Inovação, que provocou uma verdadeira revolução cultural e literária em Parnaíba, houve o ambiente propício para o aparecimento de novos nomes, que se somaram aos já referidos”.
Antes que o digam, vou logo dizendo: neste modesto e despretensioso trabalho, coloco-me como poeta parnaibano, pelos seguintes motivos: 1º) embora ame minha terra natal, considero-me um cidadão parnaibano por livre e espontânea vontade de mim mesmo e de meus amigos; 2º) sou visceralmente ligado a esta cidade desde 1975, quando minha família se mudou para cá e 3º) aqui trabalhei, construí minhas mais diletas e seletas amizades, escrevi vários dos poemas que me são mais queridos, exerci atividades culturais, bacharelei-me em Administração de Empresas, presidi o Diretório Acadêmico 3 de Março, do Campus Ministro Reis Veloso, e aqui encontrei a mãe de meus filhos. Além do mais, o Jardim dos Poetas, que reverencia os bardos, e que ora o reverenciamos, em retribuição, considerou-me como tal.
Quero, agora, fazer desfilar neste recinto poetas que desejo exaltar, em rápidas pinceladas, alguns invocados de outras dimensões (lembram-se de que o reino de meu Pai tem várias moradas?), outros vindos espiritualmente das mais longínquas paragens, e outros aqui presentes em carne e osso, e também em espírito. Não podendo referir-me a todos os poetas desta amorável e aprazível cidade, optei por citar os que estão constando do livro A Poesia Parnaibana, em razão de terem sido escolhidos pela “comissão editorial” a que já fiz referência. Como numa chamada escolar, chamá-los-ei nome a nome, e eles dirão “presente” no silêncio eloqüente de seu coração:
Ovídio Saraiva de Carvalho, que pouco mais do que apenas o local de nascimento teve de piauiense e parnaibano, cometeu poemas de sabor neoclássico, contudo os principais historiadores de nossa literatura consideram o seu livro Poemas, de 1808, como seu marco inaugural; Luísa Amélia de Queiroz, poeta de versos sensíveis e delicados como sua alma de mulher voltada para a beleza e para o amor, todavia já se denotando em alguns deles o questionamento libertário de uma mulher que pensa e deseja. Tanto almejou ser sepultada à sombra de uma gameleira, que, das entranhas de seu túmulo, misteriosamente, rebentou um exemplar dessa frondosa e bela árvore; Jonas da Silva, mestre da poesia e do simbolismo, se outros poemas magistrais não tivesse feito, bastar-lhe-ia ter escrito o exímio soneto Coração para justificar a sua passagem pela face da terra; Ala rico da Cunha, como disse num de meus Poemitos: “Poeta. Espírita. Espírito / da carne e do osso, a roer / o osso duro do ofício de poetar”. Mais do que versejar, orava em seus poemas antológicos, quando exaltava o Criador e a criação; Lili Peri, não fazia versos, fazia verdadeiras aquarelas, em que pintava e bordava a beleza lírica e bucólica das campinas e das lagoas matizadas de flores silvestres; Francisco Aires, artesão e mecânico, soube devassar e manipular a mecânica impenetrável da poesia; Edison da Paz Cunha, professor, jurista e erudito, soube cantar a beleza singela do farol e a beleza caprichosa de Pedra do Sal; Monsenhor Roberto Lopes, a bondade e a simpatia em forma de gente, anjo incógnito, com seus belos e singelos versos edificantes, ele que também foi um edificador de imponentes igrejas e convento, em sua humildade inata, meu patrono na Academia Parnaibana de Letr as; R. Petit, nascido no Pará, autor da letra do sublime hino da Parnaíba velha de guerra e de paz, tornou-se tão piauiense como os que mais o sejam, a nos brindar com seus magníficos versos criativos, tão cheios de imagem, em que abria os mistérios da poesia com as chaves de ouro de seus requintados sonetos; Berilo Neves, em determinada época bafejado pelas luzes da fama e da glória, fustigando as mulheres com a ironia de suas crônicas de um quase misógino, soube, contrariamente, escrever ternos versos, repassados de emoção e saudade, quando entrou no ostracismo de seu cone de sombra; Tomaz Catunda, de versos simples e belos, cantou a beleza cromática das campinas verdejantes e das flores multicoloridas, e em versos de sabor popular gemeu as dores da saudade; Jeanete de Moraes Souza, extraiu o belo do simples, e em versos edificantes cantou o amor da família, dos filhos, e muitas vezes rezou n os versos dedicados ao Criador; Renato Castelo Branco, homem sensível, gentil, verdadeiro cavalheiro pela lhaneza no trato, todavia foi um bandeirante destemido e audaz nos livros em que descreveu a “conquista” dos sertões de dentro, em que contou a saga dos primórdios do Piauí. Dele, na qualidade de aedo, disse Alcenor Candeira Filho, seu parente e amigo: “Agrada-me de modo especial, falar de Renato Castelo Branco, que reputamos, sem qualquer medo de cair em excesso, o maior poeta nascido em Parnaíba”; Vicente Fontenele Araújo, arrebatado desta vida tão cedo, certamente teria cometido, com o passar da idade, mais altos e mais longos vôos, entretanto, escreveu poemas significativos, em que já se podia vislumbrar a sua aderência ao modernismo, que tão tardiamente chegou entre nós; Alcenor Candeira Filho, bom de papo, bom de verso e bom de prosa, dele direi, dele que me recebeu, com lhaneza e palavras tão belas e incentivadoras, quando ultrapassei os umbrais da Academia Parnaibana de Letras, o que já disse em meu trabalho “Alcenor – Senhor e Pastor de Palavras”: “Alcenor cumpre bem a sua missão/função de poeta, ao assenhorear-se de todos os temas. Porque ser vate – além e aquém de todos os vaticínios e premonições – é cantar a vida, e a vida é a miragem e a paisagem, as rosas e as pedras, as sombras entre ruínas, o amor e os desencontros, a insônia e a insânia da cidade, a amizade, os problemas sociais, e todos os demais assuntos que a sua poesia aborda, com arte, emoção e muita pertinência. De sorte que o nosso poeta é senhor de todos os temas, e os molda, qual barro na mão do oleiro, ao sabor de suas idiossincrasias e preferências artísticas”; V. de Araújo, tenente-coronel da Polícia, lugar tenente da poesia, coronel maior do versejar, tem construído belos poemas, em que une a tradição imemorial à invenção atual; < strong>Adrião José Neto, talvez seja hoje o maior divulgador de nossa literatura, de nossa geografia e de nossa história, através dos diversos livros que escreveu, tanto didáticos como paradidáticos, poeta inspirado, tanto nos versos líricos como nos telúricos, tem também contado a saga piauiense nos romances históricos que vem escrevendo; Jorge Carvalho, poeta da transpiração e da inspiração, malabarista dos versos, prestidigitador de palavras, manipulador lúdico das sonoridades e dos trocadilhos, está nos devendo um livro de poemas, cobrado, com insistência, por mim e principalmente pelo Alcenor; Pádua Santos, político vitorioso (duas vezes vice-prefeito, foi presidente da Câmara), também contumaz vencedor de concurso literário, graças aos excelentes contos que escreveu, é ainda poeta consagrado; Paulo Véras, poeta sublime, um dos maiores do Piauí, como filho dileto dos deuses, morto na f lor da idade, fez versos sutis, prenhes de emoção e delicadezas, cultor hábil da inventividade, soube mesclar as lições do passado às conquistas da modernidade; Israel Correia, poeta e compositor, mestre do som da música e da música das palavras, poeta da paixão e da razão, do mítico e do místico, do claro e do oculto; Paulo Couto, filho do saudoso mestre Lima Couto, herdou do pai o amor à cultura e à poesia, inteligente, culto, poeta inspirado e atualizado, é também um bom cronista, pois tem estilo, e assunto é o que não lhe falta; José Luiz Carvalho, além de amante das musas, é também jornalista e radialista de sucesso, e tem reservado o melhor de seu esforço e espaço para a divulgação de nossa cultura; Fernando Ferraz, avaliado e bem avalizado por Cineas Santos, rigoroso em sua balança, mereceu ser incluído em sua coletânea Baião de Todos, bem como recebeu o seguinte comentá rio de Alcenor Candeira Filho: “Escrevendo uma poesia divorciada de qualquer forma de alienação cultural e elaborada dentro da técnica dos versos curtos, com rigorosa economia de meios (...) – não temos o menor temor de considerar Fernando Ferraz uma das melhores promessa para o futuro da poesia piauiense”; Ednólia Fontenele, líder de sua geração, é uma das melhores poetas piauienses, vocação incontrastável para a poesia, sempre soube urdir belos versos, quer estivesse vergastando as mazelas e as injustiças sociais, quer estivesse tratando dos mistérios sublimes do amor, sempre através de versos inventivos, sejam eles afagos ou açoites; Zezo Pinheiro, filho de José Pinheiro de Carvalho, idealizador e um dos fundadores da APAL, é um poeta que desde bem jovem se revelou criativo e talentoso, tanto que se voltou para a publicidade, que exige essencialmente talento e inventividade; Danilo Melo, foi secret ário de Cultura do Município de Parnaíba, no governo José Hamilton, revelando-se dinâmico e empreendedor. Poeta de boa cepa, canta as pequenas coisas do cotidiano, os flagrantes miúdos de que é feita a vida, nas suas surpresas e ciladas. Canta as vicissitudes da vida contemporânea, em poemas curtos e densos, que poderiam ser inspiradas letras de rock. Amante dos beatiniques, seu poema “Parnahyba” bem poderia ser um hino pós-moderno de nossa urbe e orbe, em sua linguagem torrencial e marcante, que até me faz lembrar as rábidas lufadas do fôlego poético de Walt Witman.
De mim nada direi, pois não bato palmas para mim mesmo, exceto que sou, desde meus dez anos de idade, um amante inveterado da poesia, e que desejaria ser correspondido por essa dama tão caprichosa e exigente, na mesma intensidade.

VI CONCLUSÃO

Diz-se ser o poeta a antena da raça. Não antena parabólica, diabólica, rocambólica. Antena da raça, sim, mas de todas as raças, de todas as tribos e de todas as etnias, a vergastar com o chicote de seu verbo de fogo os preconceitos, as imposturas e as mistificações.
Antena de profeta, mas voltada para trás e para frente, para o passado e para o futuro, sem esquecer o tempo presente, que é o seu compromisso primordial. Voltada para trás, para o passado, para extrair as lições da História, e dessa forma combater os erros do presente, e, melhor ainda, tentar evitar que se cometam esses erros. Voltada para frente e para o futuro, para produzir coisas novas e inventivas, para formular melhores soluções para os problemas de agora. Poetas, raça de Prometeu, de inconformados, de incomodados, que não aceitam as tiranias, nem dos tiranos nem do destino, a buscar nos céus ou nos infernos o fogo sagrado da redenção humana. Poetas, profetas a imprecar contra as Herodíades e Salomés das corrupções e dos desmandos, ainda que o preço seja a sua cabeça sagrada sangrando na bandeja de prata dos Herodes hodiernos.
Poeta, como já dito, significa vate. Vate de vaticínio, mas de vaticínio de tempos melhores, vaticínio da busca da Terra da Promissão, ainda que agora ela seja apenas uma promessa distante, uma Utopia longínqua e quase inacessível. Terra da Promissão no sentido de Ideal, ainda que impossível de ser conquistado em sua plenitude, mas que deve ser perseguido com todas as forças de que sejamos capazes, para a construção de um mundo mais digno, mais humano, mais fraterno, sem guerras e sem Guernicas, sem novas Hiroshimas e Nagasakis, onde não despontem no céu os cogumelos de fogo e os mísseis incendiários.
Foram, outrora, os poetas, com disse no início, os guardiães da História. Da História e das tradições, acrescento agora. Nos tempos remotos da pré-história, os poetas eram importantes, porque narravam os feitos e os fatos gloriosos e heróicos, em versos, para facilitar a memorização, como recurso mnemônico. Hoje eles se quedam acanhados, escondidos e esquecidos, por causa da força avassaladora da mídia, em sua oferta cotidiana de prazeres frívolos e fáceis, de consumo imediato, sem exigir do ouvinte ou telespectador o uso da massa encefálica. Mas, no meio desse mundo pululante de eguinhas pocotós e de danças degradantes, seja da garrafa seja da bundinha, ainda existem aqueles que têm fome e sede de poesia, a mais discreta das artes. E é para esses poucos, que se voltam os poetas, escravos do chamado poderoso e incontrastável de sua vocação, oriunda talvez dos deuses enterrados e esquecidos, mas ainda vivos, e se contorcendo e se retorcendo nas entranhas da mãe terra.
É por isso que esta homenagem do Jardim dos Poetas se reveste da mais alta significação, porque ao devolver a força, a raça, a voz e a tribuna aos poetas, devolveu-lhes, também, certamente, a auto-estima e a flama ardente da criação.
Esse jardim, o Jardim dos Poetas, será o altar e o púlpito dos velhos e dos jovens bardos, dos menestréis de todas as épocas, de todas as idades, dos aedos mortos e vivos, porque são os poetas os hierofantes e os profetas do bem, do bom e do belo, a celebrarem o culto da estética, da vida e da emoção no templo augusto da poesia.


Obras consultadas:
•    A Poesia Parnaibana – Adrião Neto, Alcenor Candeira Filho e Elmar Carvalho
•    A Poesia Piauiense no Século XX – Assis Brasil
•    Teoria e Prática da Crítica Literária – Assis Brasil
•    Aspectos da Literatura Piauiense – Alcenor Candeira Filho
•    Dicionário Biográfico Escritores Piauienses de Todos os Tempos – Adrião Neto
•    Literatura Piauiense para Estudantes – Adrião Neto
•    Leis Básicas do Estado do Piauí – Nildomar da Silveira Soares
•    Presença da Literatura Piauiense nos Vestibulares – Luiz Romero
 ______________________
 *Elmar Carvalho é magistrado, poeta, cronista e crítico literário, nasceu em Campo Maior, PI, mas viveu muito tempo em Parnaíba, membro da Academia Parnaibana de Letras e da Academia Piauiense de Letras. Foi Presidente da União Brasileira de Escritores.

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