sábado, 19 de setembro de 2015

OLIVER SACKS (1933 – 2015) - O POETA DA MENTE

 Francisco Miguel de Moura*

Na morte, Oliver Sacks foi um poeta, na verdadeira acepção da palavra. Soube morrer aceitando a doença e a caminhada até o fim.  Na vida foi um cientista experimentador e descobridor, para que nós outros  pudéssemos ter uma vida melhor. Segundo me dizia o Dr. Humberto Guimarães, também psiquiatra, na manhã de sábado passado, na Academia:  “Ele só não soube cuidar da sua vida, da sua saúde”.

Aqui reverenciamos o cientista que morreu com 82 anos de idade. O grande neurologista, cientista, pensador e escritor Oliver Sacks  despede-se do mundo, no dia 30 de agosto de 2015, em Manhattan, NewYork, Estados Unidos. Ele nasceu em 9 de julho de 1933, em Willesden, Londres, Inglaterra. A sua morte não foi inesperada, há tempo sofria de um câncer no fígado. “Sabendo que o câncer ocupa um terço do meu figado e, apesar de ser possível desacelerar seu avanço, esse tipo específico não pode ser destruído (...) Depende de mim agora  escolher como levar os meses que me restam. Tenho de viver da maneira mais rica, profunda e produtiva que conseguir”. Seu desejo era  sentir-se intensamente vivo e esperar,  no tempo que lhe restava aprofundar as amizades, dar adeus aos que amava, escrever mais, viajar se encontrasse forças ainda e atingir novos níveis de entendimento e insight.

Ele era o caçula de um casal de quatro filhos (Muriel Elsie Landau e Samuel Sacks, seus pais).  Na adolescência foi rechassado pela mãe ao revelar sua homossexualidade. Já na infância, contara a seu pai que estava dormindo junto com outro menino e acordara sem susto. Quando o pai reclamou, ele apenas disse: “Mas não houve nada, pai, era apenas um sonho”.  Formado em Medicina, foi morar nos Estados Unidos, para fugir dos surtos psicóticos de um irmão esquizofrênico.

Devia ser um neurótico atormentado, não obstante um cientista criterioso em suas pesquisas, um sábio no que fez em favor dos conhecimentos da alma humana, do cérebro humano. Só não soube cuidar de si, conhecer-se a si mesmo.  Usou LSD, tornou-se um dependente de anfetaminas, exagerava nesses vícios, fingindo que fazia experiências deles. Os amigos duvidavam que chegasse aos trinta e cinco anos. 

Publicou muitas obras, entre as quais, as  seguintes; “O homem que confundiu sua mulher com um chapéu” (1985), “Despertares” (1973), “Minha Vida” (uma autobiografia onde mostra como unir ciência, arte e filosofia) e “Um Antropólogo em Marte”. Algumas de suas obras foram filmadas com os títulos cinematográficos de “Tempo de despertar”, “A música nunca parou”`, “À primeira vista” e “Ponto vermelho”.

Mostramos aqui uma pequena parte da introdução da obra “O homem que confundiu sua mulher com um chapéu”, que traz várias pesquisas do eu, da consciência e da vida psíquica do homem em geral, mas, de modo particular, casos de prospagnosia, como o título bem indica. Não sabemos se o texto, a seguir transcrito, é a melhor parte, pois tirado de livro bastante longo, e eu tenho feito minhas pesquisar através da internet, onde pude encontrá-lo:

“O ser essencial do paciente é muito relevante nas esferas superiores da neurologia e na psicologia, pois, nestas áreas, a individualidade do paciente está essencialmente envolvida, e o estudo da doença e da identidade não pode ser desarticulado. De fato, esses distúrbios, juntamente com sua descrição e estudo, exigem uma nova disciplina, que podemos denominar ”neurologia da identidade”, pois lida com as bases neurais do eu, como antiquíssimo problema de mente e cérebro. É possível que deva existir, necessariamente, um abismo, um abismo categórico, entre o psíquico e o físico; mas os estudos e as histórias que concernem simultaneamente a ambos — e são estes que me fascinam em especial e que (de um modo geral) apresento neste livro — podem, não obstante, servir para aproximá-los mais, para nos levar à própria intersecção de mecanismo e vida, à relação dos processos fisiológicos com a biografia”.

Quando Sacks “posou”, no escritório de seu apartamento localizado no bairro de West Village, em Nova York, talvez para sua última fotografia, estampada na pag.79, da revista “Veja”, de 9 de setembro de 2015, logo em seguida levantou-se, pediu ao repórter que o acompanhasse até a janela, e apontando para determinado lugar, disse:

“Quero mostrar Deus, olhe lá!” – e sorriu.

Vejamos o que ele apontava: Uma carroceria de um caminhão com a palavra GOD.

Morreu assim: brincalhão, surpreendente, irônico e rápido no raciocínio. Ao jornalista que escreveu a matéria da “Veja”, uma página somente, eu perguntaria: Por que não escreveu muito mais? Não sei se estaria “puxando essa brasinha para meu espeto” porque sou portador de “prosopagnosia”, uma doença que se caracteriza principalmente pela dificuldade que têm os prosopagnósicos de reconhecer rostos humanos.  O mal afeta quase um terço da população do globo. Muitos são portadores e nem se dão conta. Até agora ninguém encontrou remédio para minorar o mal e muito menos para curá-lo.
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Francisco Miguel de Moura, escritor, membro da Academia Piauiense de Letras,autor deste artigo.

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