segunda-feira, 16 de julho de 2012

QUAIS SÃO NOSSOS VALORES?

                            
Francisco Miguel de Moura 
– Escritor, Membro da Academia Piauiense de Letras.

Já nascemos condenados à socialização, qualquer recusa de adaptação aos mil modos dos sistemas sociais nos levará ao sofrimento ou mesmo à morte. A partir da família – a célula “mater” – inicia-se o jogo de culpar os outros e inocentar-se de tudo. Discordâncias, brigas com pais e irmãos, para depois chegar aos vizinhos e a outros setores da vida social. É que o “homo sapiens” nunca deixou de guerrear, é uma “tara” primitiva.  Partindo deste princípio, os legisladores e os governos costumam fazer leis para coibir as culpas, os deslises, as desavenças, as brigas, os crimes. Há para tudo uma lei. Leis que complementam e leis que contrariam outras leis; e leis que desrespeitam a Constituição, a lei maior de um pais, de uma nação democrática. Assim nascem as leis casuísticas. Para cada caso, normalmente em defesa própria, nasce uma lei, um decreto, um artigo, um parágrafo, uma alínea. E os códigos vão se avolumando. O Brasil tem cerca de 181 mil leis (a pesquisa é atrasada, o número já deve ser muito maior). Segundo Rudolfo Lago (“Isto É”, 4/4/2007), “somos um dos regimes legais mais anacrônicos do mundo”. Aos advogados, juízes, policiais e autoridades se impõe a tarefa hercúlea de fazer essas leis funcionarem, agindo para o seu cumprimento. Não há quem possa abarcar tudo. E lei sem cumprimento é como se não houvesse, só serve mesmo para disfarçar que os legisladores e governantes estão fazendo alguma coisa em benefício da população. Ainda ontem ouvi uma deputada propor uma lei que completasse, para as empregadas domésticas, os mesmos direitos que têm os demais trabalhadores: fundo de garantia e não sei mais lá o quê. Felizmente, o jornal, em seguida, ouvindo um jurista competente no assunto, arremata com as declarações dele: “No momento, é mais importante que sejam cumpridos, com relação à empregada doméstica, todos os direitos que ela já tem, que em boa parte não são observados ou o são apenas formalmente”.
O não cumprimento das leis ocorre porque tudo começa pelo princípio da hipocrisia, da desonestidade. É preciso que façamos um ato de contrição e digamos alto bom som que “o povo” brasileiro (incluindo eu e você) não é nada bonzinho. Somos displicentes, preguiçosos, mentirosos, desonestos, gananciosos, maus pagadores, mal educados, e por aí vai. Uma lei não opera milagre se todos não estiverem de acordo que ela seja realmente necessária.  Se cada um não fizer a sua parte não chegaremos, a lugar nenhum como nação, como povo, como cidadãos brasileiros.  Compromisso é compromisso, verbal ou não. As regras de ética e moral não são necessariamente escritas, seguimo-las por tradição.  Gostamos de prometer e não cumprir, também de ganhar no grito. Ora, no grito não se ganha nada. Uma discussão, uma briga que pode acabar com um acordo, especialmente no trânsito, termina muitas vezes em morte. O estresse e as taras do “homo sapiens”, funcionando conjuntamente, fazem em cada um de nós uma fera. Gostamos de ser elogiados. Mas o que fizemos nesses 500 anos de vida? Deixamo-nos levar na onda das estatísticas da mídia e sequer temos o trabalho de ler os dados do IBGE, a instituição encarregada de mostrar nosso retrato mais fiel, de tempos em tempos. Gostamos de uma guerrinha, se for para sair ganhando algum valor econômico. Mas precisamos saber que a economia não deveria nos governar, nos escravizar nos colocando acima dos valores morais e éticos. Segundo Teresinka Pereira, com base em pronunciamento do escritor Carlos Fuentes: “A América Latina e até mesmo a América do Norte estão vivendo a grande crise internacional dos 4Ds (porque tanto em português, como em espanhol e inglês há quatro fatores cujos nomes começam com a letra “D”): Dívida, Droga, Desenvolvimento, Democracia”. Os valores éticos universais têm sido de “piedade” com os miseráveis, sem mexer um dedo para minorar-lhes o sofrimento; indulgência para com os ladrões privados e/ou políticos, porque, segundo raciocinamos, não são assim porque querem, mas porque certas condições não lhe foram dadas para serem bons: esse é “o homem cordial” do historiador Sérgio Buarque de Holanda.  Justiça somente para os nossos inimigos, para nós e os amigos sempre queremos o “jeitinho”. Cansativo demais enumerar nossos defeitos. Precisamos melhorar. E ficamos nisto: na boa intenção. Mas, como o vulgo diz, “de boas intenções o inferno está cheio”.

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