segunda-feira, 27 de junho de 2022

 


RECORDAÇÕES DA CASA DOS VIVOS

Rogério Santos, membro da Academia de Letras do Vale do Riachão (ALVAR)

 

 

Eu cresci no roçado verdejante

Sob as noites na luz do candeeiro

Fiz campinho de bola no terreiro

A boiada toquei pelo berrante

Hoje, eu sinto isso tudo tão distante

O destino mudou minha jornada

Mas a minha retina marejada

Acabou de ficar pela lembrança

Eu lembrei dos meus tempos de criança

Ao voltar à casinha abandonada.

 

Pra matar, de saudade, a minha sede

Fui ao pote de barro e à bilheira

Às imagens da santa padroeira,

Os alforjes e à cela na parede

À ferrugem nos tornos onde a rede

Eu armava depois da empreitada

À mochila de escorrer a coalhada,

Contrapeso e os pratos da balança

Eu lembrei dos meus tempos de criança

Ao voltar à casinha abandonada.

 

O passado presente nas ruínas

Do local, que no cerne, está perene

Embebece o pavio de querosene

Da memória, não mais das lamparinas

Mausoléu de conversas vespertinas

De algum mito ou estória recontada

Hoje é só uma área isolada

Sem vestígios de alguma vizinhança

Eu lembrei dos meus tempos de criança

Ao voltar à casinha abandonada.

 

Pelo lado de fora outra visão

Abateu-me de modo alvissareiro:

Duas iniciais no cajueiro

E ao redor delas tinha um coração

Invadido por uma sensação

De outra mão com a minha entrelaçada

A lembrança do tempo que a amada

Trocaria comigo uma aliança

Eu lembrei dos meus tempos de criança

Ao voltar à casinha abandonada.

 

 

 

Quando a vida me trouxe essas propostas

Tinha em mente uma série de perguntas

Os meus pais à porteira de mãos juntas

Para o céu me indicar quais as respostas

Ao passar a soleira e dar as costas

Pela frente busquei nova morada

No retorno, trilhando a mesma estrada

Recordei a partida de esperança

Eu lembrei dos meus tempos de criança

Ao voltar à casinha abandonada.

 

 

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