RECORDAÇÕES DA CASA DOS VIVOS
Rogério Santos, membro da Academia de Letras do Vale do Riachão (ALVAR)
Eu cresci no roçado verdejante
Sob as noites na luz do candeeiro
Fiz campinho de bola no terreiro
A boiada toquei pelo berrante
Hoje, eu sinto isso tudo tão distante
O destino mudou minha jornada
Mas a minha retina marejada
Acabou de ficar pela lembrança
Eu lembrei dos meus tempos de criança
Ao voltar à casinha abandonada.
Pra matar, de saudade, a minha sede
Fui ao pote de barro e à bilheira
Às imagens da santa padroeira,
Os alforjes e à cela na parede
À ferrugem nos tornos onde a rede
Eu armava depois da empreitada
À mochila de escorrer a coalhada,
Contrapeso e os pratos da balança
Eu lembrei dos meus tempos de criança
Ao voltar à casinha abandonada.
O passado presente nas ruínas
Do local, que no cerne, está perene
Embebece o pavio de querosene
Da memória, não mais das lamparinas
Mausoléu de conversas vespertinas
De algum mito ou estória recontada
Hoje é só uma área isolada
Sem vestígios de alguma vizinhança
Eu lembrei dos meus tempos de criança
Ao voltar à casinha abandonada.
Pelo lado de fora outra visão
Abateu-me de modo alvissareiro:
Duas iniciais no cajueiro
E ao redor delas tinha um coração
Invadido por uma sensação
De outra mão com a minha entrelaçada
A lembrança do tempo que a amada
Trocaria comigo uma aliança
Eu lembrei dos meus tempos de criança
Ao voltar à casinha abandonada.
Quando a vida me trouxe essas propostas
Tinha em mente uma série de perguntas
Os meus pais à porteira de mãos juntas
Para o céu me indicar quais as respostas
Ao passar a soleira e dar as costas
Pela frente busquei nova morada
No retorno, trilhando a mesma estrada
Recordei a partida de esperança
Eu lembrei dos meus tempos de criança
Ao voltar à casinha abandonada.
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